Nesta quarta-feira (5 de julho), o deputado Aguinaldo Ribeiro, designado relator da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da reforma tributária, deverá apresentar ao plenário da Câmara o seu relatório final, substitutivo das duas propostas em tramitação (PEC 45/19, da Câmara, e PEC 110/19, do Senado). Entre vários pontos de convergência, segundo o coordenador do Grupo de Trabalho, há o imposto sobre bens e serviços, que será dividido em dois: um federal e outro de estados e municípios, para substituir cinco tributos: IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS.
O novo imposto chamar-se-á IVA – Imposto sobre Valor Agregado. O relator afirma que o ideal seria termos um único IVA. Infelizmente, isso não é possível no Brasil. A especificidade de alguns setores inviabiliza a tributação única. De acordo com o dep. Reginaldo Lopes, coordenador do GT, a reforma será uma política de ganha-ganha. Todos ganharão com o crescimento econômico. Municípios pobres terão vantagens em relação aos mais ricos, mas estes também ganharão; estados pobres serão favorecidos, mas os ricos também terão suas vantagens.
O parlamentar afirma que será uma transição de longo prazo: 20, mais 20 anos, com critérios de distribuição corrigidos e equalizados, porém no mesmo nível de arrecadação atual. Isto é, sem aumento da carga tributária. Ao contrário do que hoje ocorre, a tributação dar-se-á no local de consumo do bem ou serviço. A cobrança na origem beneficiará estados mais industrializados que, em tese, terão menor tributação, mas suas empresas serão beneficiadas com o fim da cumulatividade. Ou seja, a cobrança de imposto sobre insumos anteriormente tributados.
Há três fontes de tributos: 1. patrimônio; 2. consumo de bens e serviços; e 3. renda.
O patrimônio compõe-se de cinco tributos clássicos: IPTU (urbano); ITR (rural); IPVA (veículos); ITBI (intervivos); e ITCD (causa mortis e doações). Juntos, somam apenas 4,4% da tributação nacional. Na OCDE, a média é 5,5%. Nos países mais evoluídos, a média é 10%. O imposto de renda e proventos de qualquer natureza de pessoas físicas e jurídicas (salários, dividendos, juros, royalties, aluguéis, etc.) representa 21% dos tributos brasileiros; na OCDE, 34% e nos EUA, 49%.
A tributação do consumo no Brasil chega a 50% da arrecadação; na OCDE, 32% e nos EUA só 17%. Nossa tributação dilui o poder aquisitivo das famílias. Nos EUA, que representa 21% do PIB mundial, a maior incidência tributária não recai sobre o consumo, mas sobre a renda. O tributo sobre consumo – que todos, ricos e pobres, pagam sem saber – somado aos da folha de pagamentos (INSS, Sistema S, Funrural, salário educação, mais o FGTS, que é salário retido), totalizam quase 75% da arrecadação brasileira. Essa é a injustiça que precisa ser corrigida
O setor de serviços, segundo o IBGE, representa 69% do nosso PIB e 70% da mão de obra empregada. Merece olhar diferenciado na tributação. De igual modo, a corretagem de imóveis. Essa tem sido a luta do Sistema Cofeci-Creci e de nossa nova Frente Parlamentar. Propusemos ao relator da PEC que acresça aos regimes com alíquotas específicas – art. 9º, inciso II (operações com bens imóveis) – o item c) intermediação de negócios imobiliários, e item d) locação, administração e arrendamento de bem imóvel. A Lei Complementar definirá a alíquota.
Longe de ser consenso, a proposta deve enfrentar resistências de diversos setores. A Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS) disse que recebeu com surpresa o texto apresentado na quinta-feira (22), que não incluiu a isenção de tributos para alimentos básicos. Segundo a entidade, os itens da cesta básica terão aumento de mais de 60%. Na região Nordeste, a impacto seria de pouco mais de 35%. ˜A reforma em discussão no Congresso não pode prejudicar justamente os consumidores que mais serão impactados em caso de aumento da tributação de itens da cesta básica”. Criticou João Caros Galassi, presidente da Associação Brasileira de Supermercados
Para o professor Ives Gandra da Silva Martins, a atual proposta de reforma tributária traz inúmeras preocupações. “Não sou contra a reforma, sou contra o açodamento da sua aprovação, em uma semana, sem passar pelos procedimentos para aprovação de uma emenda constitucional. É um texto novo. Não é nem a PEC 45 e nem a PEC 110. É um texto que tira algo da PEC 110, tira algo da PEC 45 e cria uma série de discussões novas que enfim não foram debatidas nas Comissões de Constituição e Justiça, na Comissão Especial e nem passou pelas 40 sessões regimentais, que é o que exige a Constituição Federal para a aprovação de emendas constitucionais”, argumentou.
Portanto, segundo o professor, “nós temos um novo projeto, cuja redação obtivemos, mas que não foi discutida por nenhuma dessas duas comissões. O novo projeto que tem uma série de aspectos novos que não constam nem da PEC 45, nem da PEC 110 e está sendo apresentado não em 40 sessões, mas para ser votado em aproximadamente uma semana na Câmara dos Deputados”.
Para a Fecomércio de São Paulo, o texto “é uma grave ameaça ao setor mais importante do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e responsável por dois terços dos empregos da economia do País: os serviços — uma vez que, se aprovado, o projeto vai representar aumento significativo da carga tributária para empresas de todos os segmentos e portes dentro do setor”. Para a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP),
a medida não é suficiente, já que aplicável apenas para algumas atividades, e as empresas do setor, de uma forma geral, têm na folha de pagamentos a sua principal despesa — e ela não dá direito a créditos dentro do regime tributário. “Pior do que isso, a proposta de criar dois impostos sobre o consumo (o IVA dual) é repleta de incertezas. Uma delas, por exemplo, é sobre a alíquota definitiva adotada para o novo tributo subnacional previsto no texto, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substituiria os atuais ICMS e ISS”, disse em nota a entidade.
A Federação vê esse ponto com preocupação, já que as atuais alíquotas dos dois tributos são de 18% para o ICMS e de 5% para o ISS, e cálculos simples já apontaram, justamente, para o aumento da carga tributária sobre setores relevantes da economia. Para a Fecomercio-SP e os sindicatos filiados, a reforma tributária ideal passa por três pilares:
1. Redução (ou ao menos constância) da carga tributária setorial, uma vez que a carga nacional já é elevadíssima;
2. Simplificação do sistema tributário, mediante a adoção de legislação nacional do ICMS e do ISS, com tributação no destino e cadastro e nota fiscal unificados, além da eliminação de obrigações acessórias em duplicidade — ocasionando a consequente redução do elevado custo de conformidade fiscal — e da extinção das multas abusivas e desproporcionais;
3. Segurança jurídica, com a manutenção das terminologias já adotadas e consagradas, cujas definições e cujos limites levaram anos para serem consolidados pela jurisprudência.
A Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco) chama a atenção para o perigo de subordinar os fiscos, responsáveis pela administração tributária, a um conselho de administração que poderá ser composto por membros da iniciativa privada.
De acordo com a entidade, caso essa medida seja consolidada na proposta da Reforma Tributária, pode-se comprometer o sigilo das operações mercantis, dos dados, da vida privada e da intimidade dos cidadãos. Tal situação levanta sérias preocupações quanto à proteção dos direitos individuais e à segurança dos contribuintes.
Outra questão é o risco de ter mais o dinheiro público gerido por uma entidade que irá concentrar cifras astronômicas para depois repassar aos entes subnacionais. Além disso, há uma inquietação com relação à possibilidade de decisões administrativas em matéria tributária serem tomadas pelos próprios autuados, em vez de serem atribuição dos servidores de carreira da administração tributária. A Fenafisco considera essa possibilidade uma aberração, sem comparação em países desenvolvidos.
A entidade destaca ainda que, um conselho federativo ameaça o pacto federativo, elimina a autonomia dos entes federados e, por consequência, coloca em risco o próprio conceito de democracia. A entidade ressalta a importância de garantir a segurança jurídica e a estabilidade das instituições tributárias.
A reforma tributária que deverá ser debatida e apreciada pelo Congresso Nacional nos próximos meses vai impactar diretamente a área médica. É o que antevê a administradora Júlia Lázaro, sócia-fundadora e CEO da Mitfokus, startup especializada em soluções financeiras para a área de saúde. Impacto esse que deverá ser traduzido em aumento da carga de tributos.
O peso desse aumento ainda vai depender de como o novo governo e o atual legislativo vão conduzir as propostas. Cálculos de dois anos atrás projetavam um acréscimo de 75%. Esse incremento virá principalmente da taxação de lucros e dividendos, que atingirá em cheio os profissionais contratados como pessoa jurídica (PJ), prática cada vez mais recorrente no setor.