Proteste defende parcelados sem juros
7 de fevereiro de 2024
Redação

Na quarta-feira, 13, a Proteste, maior associação de consumidores da América Latina, divulga posicionamento em defesa do parcelamento sem juros e destaca a inconstitucionalidade de uma eventual regulação do parcelado pelo Banco Central. O novo posicionamento foi extraído com base em discussões sobre o tema no Euroconsumers Forum de Brasília.
 

Em novembro, a Proteste organizou a jornada brasileira do fórum, que teve como tema: Eficiência e Equilíbrio para o Consumo. Ela buscou demonstrar, através de debates extremamente pragmáticos, como a proteção e promoção dos interesses econômicos dos consumidores abre uma perspectiva totalmente nova para o consumerismo, tornando-se como um motor para o desenvolvimento. Entre os temas que foram tratados, destacamos o Parcelamento sem Juros, que vem sendo discutido pela Protestedesde o começo e que ainda exige total atenção.
 

Diante disso, a Proteste fez um novo posicionamento, destacando a importância do parcelado sem juros para os consumidores e as práticas inconstitucionais que rondam o tema. Confira:

EM DEFESA DO PARCELADO SEM JUROS

(INCONSTITUCIONALIDADE DE SUA REGULAÇÃO PELO BC)

O Parcelado Sem Juros (“PSJ”) é a modalidade de vendas realizada com cartão de crédito que permite ao consumidor adquirir bens e serviços a partir de parcelas mensais, sem a necessidade de contratação de operações bancárias. Nesse sentido, é indispensável ao acesso de consumidores ao mercado, principalmente aqueles de baixa renda. Apesar da sua indiscutível importância para a economia brasileira, houve tentativas de limitar, onerar ou extinguir o PSJ. As mais recentes investidas foram tornadas públicas por grandes emissores de cartão de crédito no curso das discussões do projeto de lei federal que deu origem à Lei nº 14.690/2023, criadora do Programa Desenrola. Referida lei atribuiu aos emissores a obrigação de submeter à apreciação do Conselho Monetário Nacional (“CMN”) propostas para a limitação da taxa de juros do crédito rotativo[1], sendo que a ausência de acordo resultará na limitação dos juros ao montante da dívida, ou seja, 100%. Privados da cobrança das taxas de juros extorsivas atreladas ao crédito rotativo, emissores têm exigido compensação pela queda do seu faturamento. Para tanto, passaram a produzir narrativas artificiais no sentido de que a inadimplência do cartão de crédito seria decorrente do empilhamento de parcelas em uma mesma fatura, fruto do PSJ. Seu verdadeiro objetivo, contudo, é desviar consumidores a formas de financiamento bancário muito mais caras (alcançando 8% ao mês[2]), favorecendo apenas os grandes bancos.

É conhecida a adesão da Proteste à campanhas e manifestos assinados por diversas instituições dos vários setores, manifestando-se contra o fim ou qualquer limitação da modalidade PSJ. No dia 23 de novembro, foi realizada em Brasília, durante o Euroconsumers-Forum 2023, uma mesa de debates que visou dar consistência ainda maior ao

seu posicionamento, resultando em conclusões de natureza jurídico-constitucional que apontam como inconstitucional qualquer regulação nesse sentido por parte do BANCO CENTRAL DO BRASIL, como passamos a expor.

DA INCONSTITUCIONALIDADE DA REGULAÇÃO DO PSJ PELO BC

A eventual intervenção do Banco Central do Brasil nas dinâmicas de mercado que viabilizam o PSJ seriam inconstitucionais por (i) violar os princípios da proteção do consumidor, livre iniciativa e livre concorrência; (ii) não estar contemplada nas competências legais atribuídas ao Banco Central (“BC”) e/ou ao CMN; (iii) não encontrar respaldo na Lei do Desenrola; e (iv) poder atentar contra a ordem econômica. Senão, vejamos:

  1. A imposição de medidas que prejudiquem consumidores em benefício de grandes agentes econômicos viola a Constituição Federal

Medidas de limitação do PSJ retiram a decisão de parcelamento dos lojistas, restringindo a sua liberdade de escolha em relação à melhor maneira de concretizar a sua venda, e privam os consumidores da utilização desse método de pagamento fundamental para seu planejamento financeiro e viabilização de compras de maior expressão. Tal privação de direitos viola nitidamente os princípios e valores constitucionais conexos da defesa do consumidor, da livre iniciativa e da livre concorrência, expressos pelo artigo 170 da Constituição Federal, ao dispor sobre e Ordem Econômica brasileira. Dessa forma, a edição de ato normativo que limite o PSJ atenta contra a Constituição Federal, conforme concluem os Professores Carlos Velloso[3] e Gustavo Binenbojm[4]. Também lembremos que a defesa do consumidor é, ainda, um Direito Fundamental (CF, art. 5º, XXXII). Ambos dispositivos constitucionais (direito fundamental e princípio da ordem econômica) são regulamentados por uma lei complementar à constituição, a saber a Lei 2.181, de 20 de março de 1997, conhecida como Código de Proteção e Defesa do Consumidor que, em seu artigo 4, inciso I, reconhece a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, cabendo ao Estado a promoção da sua defesa, fazendo, assim, face às assimetrias de informação, ao abuso de poder econômico, à concentração de mercado e outras características e práticas que o tornam impotente frente à ação dos outros atores de mercado. Ora, à luz desse dispositivo, qualquer imposição de ônus ou exclusão de benefícios ao agente de mercado que deve ser amparado e protegido pelo Estado, deve ser rechaçada, ainda mais quando partir do próprio Estado a quem cabe a obrigação legal de protegê-lo.

  1. Não há competência legal para restrição do PSJ pelo BC ou CMN

Isso porque, conforme atesta o Professor Velloso, a competência normativa atribuída pela Lei nº 4.595/64 ao CMN e ao BC diz respeito à regulação das instituições financeiras, do Sistema Financeiro Nacional e do crédito em todas as suas modalidades. Todavia, o controle e a disciplina sobre o crédito estão restritos ao crédito bancário. A Lei nº 12.865/13, por seu turno, define a competência do BC para regular a atividade de meios de pagamento, que está adstrita à disciplina dos arranjos de pagamento e das instituições que deles participam, não abrangendo o relacionamento firmado entre portador e lojista.

  1. A Lei do Desenrola não conferiu poderes ao CMN e BC para limitar o PSJ

A Lei nº 14.690/23 conferiu poderes ao CMN para recepcionar, por meio do BC, propostas de autorregulação dos emissores de cartão referentes à limitação das taxas de juros do crédito rotativo. Assim, cabe-lhes, tão somente, aprovar ou reprovar as propostas apresentadas, não havendo qualquer mandato do legislador para interferência ou composição de interesses em outra matéria, ou seja, no que se refere ao PSJ.

  1. A atuação coordenada de emissores para esvaziar o PSJ pode configurar infração contra a ordem econômica, reprimida pela Lei nº 12.529/11

Com o objetivo de impulsionar a demanda de soluções próprias em prejuízo de alternativas melhores e mais acessíveis, condutas coordenadas de bancos incumbentes que restrinjam o PSJ configuram infração contra a ordem econômica. Referidas condutas podem se dar pela ação coordenada de bancos para obter medida estatal que desincentive o PSJ e pela recusa de transações parceladas em massa, independentemente de medida estatal.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, reitera-se que qualquer iniciativa normativa oriunda do BC que limite ou onere o PSJ deve ser legislativa e juridicamente rechaçada por violar princípios basilares da Constituição Federal.

Nesse sentido, no caso, que esperamos não se verifique, de regulação restritiva por parte do BC, caberá a apresentação, por qualquer parlamentar de um Projeto de Decreto Legislativo para Anulação de Ato do Poder Executivo, sendo que os presentes estudos e argumentos estarão à disposição dos diversos deputados e senadores, da mais ampla gama partidária, que já se manifestaram contra a indevida interferência no PSJ.

Da mesma forma, não está excluída a possibilidade de recurso ao Supremo Tribunal Federal, corte constitucional na Nação.

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