O governo federal aumentou o imposto de importação de resíduos sólidos com o objetivo de fortalecer a cadeia nacional de reciclagem. A alíquota, que estava zerada para resíduos de papel e vidro e em 11,2% para plástico, passa a ser de 18% a partir desta terça-feira (1º). A medida não afeta os resíduos de vidro incolor, já que não há fonte alternativa no país em volume suficiente para atender as necessidades da indústria. De acordo com o governo, entre 2019 e 2022, as compras externas de papel, vidro e plástico subiram, respectivamente, 109,4%, 73,3% e 7,2% — o que afeta o preço de venda dos materiais no mercado nacional.
O presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cadeia Produtiva de Reciclagem, deputado federal Carlos Gomes (Republicanos-RS), afirma que a medida adotada pelo governo foi resultado de uma ação organizada dos catadores, que atribuem a baixa no valor dos materiais no mercado nacional à importação dos resíduos. O parlamentar acredita que a elevação das alíquotas de importação estimula a cadeia produtiva nacional, mas também defende um tratamento tributário diferenciado para toda a cadeia de reciclados.
“Desde quem tria, na comercialização, no transporte, porque aí nós estaríamos incentivando na prática aquelas que estão atuando na ponta. Até porque esses materiais já foram tributados no mínimo de três a quatro vezes. Cada embalagem, até envasar um produto, chegar na gôndola, você comprar, consumir e descartar, já teve várias tributações. Então não cabe mais tributar uma embalagem que foi descartada, que foi posta fora — e você retira isso, põe novamente na cadeia produtiva e tem que tributar novamente, isso é muito injusto”, afirma o deputado.
Para o especialista em direito tributário e consultor jurídico do Instituto Nacional de Reciclagem (Inesfa), Rodrigo Terra, a medida é importante, mas não é suficiente para o setor. Ele argumenta que a importação de resíduos atualmente não representa uma quantidade capaz de causar uma grande variação no mercado nacional. Terra defende a desoneração do setor.
“Quando a gente fala da venda de insumos recicláveis, a gente está falando que a venda desses insumos reciclados tem exatamente a mesma tributação do que a venda daqueles insumos extraídos da natureza. Então quando a gente olha para uma indústria de transformação, por exemplo, que precisa comprar matéria-prima, ela tem opção de comprar matéria-prima reciclada ou matéria-prima virgem extraída da natureza, pensando pelo ponto de vista tributário, ela não tem absolutamente nenhum incentivo para escolher a matéria-prima reciclada frente à matéria-prima extraída da natureza”, explica.
Debate no Congresso
Dentre as propostas que tratam sobre o tema em tramitação no Congresso Nacional está o projeto de lei 4035/2021. A proposta autoriza o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins na aquisição de materiais que compõem as cadeias produtivas de produtos reciclados, ou seja, o abatimento de custos na cadeia de produção.
A proposta também isenta da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, não integrando a base de cálculo das referidas contribuições, a venda de desperdícios, resíduos ou aparas para pessoa jurídica que apure o imposto de renda com base no lucro real. A legislação atual estabelece a suspensão da incidência de PIS e Cofins na aquisição de materiais recicláveis. Carlos Gomes destaca a relevância do projeto, mas entende que mudanças feitas pelo Senado no texto da reforma tributária podem ser mais eficientes.
“O projeto é bom, mas se nós pudermos vencer etapas e já colocar na reforma tributária, eu acho que a gente ganha muito tempo e agilidade. Então eu penso que é um projeto bom. Não tem como criticar, pelo contrário. Só que a tramitação do projeto individualmente vai demorar muito mais do que se simplesmente alterarmos a reforma.”, pontua.
O texto aguarda parecer do relator na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, apensado ao PL 1800/2021.
Frente da reciclagem: desoneração do setor na reforma tributária é questão de justiça
Reciclagem
No Brasil, cerca de 22 milhões de pessoas não possuem acesso à cobertura de coleta domiciliar de lixo. Segundo dados do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), as regiões Norte e Nordeste apresentam os menores índices.
O Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2022, publicado pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), mostra que o país gerou cerca de 81,8 milhões de toneladas de resíduos em um ano, o que corresponde a 224 mil toneladas diárias. Em média, cada brasileiro produziu 1,043kg de resíduos por dia.
Além disso, o país ainda possui mais de 2.400 lixões, apesar da meta estabelecida na Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) de que não haja mais descarte nesses locais até 2024. Instituída em 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos prevê a redução de resíduos, o estímulo de hábitos sustentáveis e o aumento da reciclagem e reutilização dos resíduos sólidos, além de dispor sobre a destinação adequada dos materiais.
O Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2022 também mostra que lixões e aterros controlados ainda seguem em operação em todas as regiões do país e receberam 39% do total de resíduos coletados — o que corresponde a um total de 29,7 milhões de toneladas com destinação inadequada.
Conforme o estudo, estima-se que, entre 2016 e 2021, o gasto total da saúde no Brasil para tratar dos problemas em decorrência da destinação inadequada de resíduos foi de US$ 1,85 bilhão.
Logística reversa
Um mecanismo importante previsto na Política Nacional dos Resíduos Sólidos é a logística reversa. Uma ferramenta que proporciona o retorno de materiais ao ciclo produtivo. A ideia é que resíduos, como embalagens, eletroeletrônicos, baterias e outros retornem ao setor responsável pela produção para que tenham uma destinação adequada.
A lei 12.305/2010 define a logística reversa como o “instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”.
Fonte: Brasil 61